quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Cotidiano e o canto do bem-te-vi

Entender a cabeça de um músico ou de um poeta é algo muito louco. Recebi por acaso este vídeo hoje e me veio à memória um fato que eu estou para comentar há horas.



Tu já ouviste o canto de um bem-te-vi? Que fica repetindo à exaustão "bem-te-vi! Bem-te-vi! Bem-te-vi!"? Claro que sim. Isso é o que acontece com a massa geral da espécie dos bem-te-vis. Todos sabem que nós, humanos (se tem alguém não-humano lendo aí, peço perdão), temos indivíduos, ou espécimes, que se destacam dos outros, de forma a ganhar um brilho sem igual, que chega a durar gerações e mais gerações, como é o caso do Chico Buarque. Mas nem todos sabem que isso também acontece no reino animal (dos demais animais, incluindo sapos, baratas, ursos, galinhas e bem-te-vis, mas não nós, humanos - perdão mais uma vez).
Buenas, vamos agora à minha história. Eu, quando ainda morava em Pelotas, em um semi-chalé de madeira (uma suíte, por assim dizer), construído sobre o teto da casa dos meus pais, certo dia notei um canto de bem-te-vi diferente... Ele bem-te-vizeava em uma cadência incomum, mas ainda assim muito familiar. Em vez daquela monótona repetição, ele cantava: "Bem-te-vi, bem-te-vi, bem-te-vi, te-vi..." (tenta cantar isso mentalmente pra ver o som que dá, sem esquecer que as reticências do final são muito importantes). Isso foi uma vez. Agora imagina que todo dia ele fazia tudo sempre igual. Não sei se chegava a me sacudir às seis horas da manhã, e nem se ele me sorria um sorriso pontual, mas definitivamente não me beijava com a boca de hortelã. Virou quase uma rotina. Ficou cotidiano. Mas era muito legal.

Tá me acompanhando?

Pois então, aquele bem-te-vi, para mim, era um espécime raro, com brilho próprio, que um dia resolveu ousar. Talvez seja o mesmo que cantou na janela do Chico, enquanto a Marieta sacudia ele às seis horas da manhã, sorria para ele um sorriso pontual e o beijava com a tal boca de hortelã patrocinada pelo creme dental Eucalol. Talvez seja um bem-te-vi da nova geração que não quer deixar morrer o canto de seu mestre. Talvez seja um bem-te-vi que nunca ouviu falar do Chico Buarque, mas que resolveu ousar e fugir da rotina do cotidiano e da repetição. Me pergunto se a inspiração para compor Cotidiano não foi exatamente esta. Será que tudo começou com o canto de um bem-te-vi? Sei lá, é possivel. Um dia eu pergunto pra ele.

Nenhum comentário:

ShareThis